Justiça informa sobre direitos da mulher em praça pública
A educação é o principal recurso para o combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. É o que defendem os três magistrados das Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Belém. Orientações às mulheres, com o foco no empoderamento, a fim incentivar a denúncia e palestras realizadas especificamente com homens, com o propósito de conscientizar sobre o papel da mulher, estão entre algumas das ações do Judiciário paraense no combate à violência de gênero.
Dados da Coordenadoria de Estatística e da Secretaria de Informática do Tribunal de Justiça do Pará apontam que 10.103 medidas protetivas foram distribuídas entre os anos de 2015 e 2016 no estado do Pará, sendo 4.503 concessões em 2015 e 5.600 medidas em 2016. A medida protetiva tem a função de proteger a mulher vítima de violência doméstica e familiar. É um processo acessório das ações penais e é de natureza cautelar, no qual é uma série de espécies de proteção à vítima.
No Pará, quatro Varas têm competência exclusiva no julgamento de casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. São três Varas na Comarca de Belém e uma Vara de Juizado Especial na Comarca de Santarém. Nos anos de 2015 e 2016, a 1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belém distribuiu 3.275 medidas protetivas; a 2ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belém distribuiu 1.630 medidas protetivas; e a 3ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belém distribuiu 1.614 medidas protetivas.
O titular da 2ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belém, juiz Maurício Ponte de Souza, explica que todo e qualquer caso em que haja violência, seja física, psicológica, moral, sexual ou patrimonial, é passível do agressor receber uma medida protetiva. “Via de regra tem que ser solicitada pela própria vítima por meio da autoridade policial”, completou.
Para a titular da 1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belém, juíza Rubilene Rosário, os fatores que contribuem para a violência doméstica e familiar contra a mulher são cultural e educacional. “A Lei Maria da Penha (Lei nº. 11.340/06) previu esse instituto de proteção, mas infelizmente não previu uma forma de fiscalizar o seu cumprimento. A lei é um instituto que busca muito mais que punir, busca também a prevenção e, por conseguinte, a erradicação desse tipo de violência”, observa.
A questão sociocultural é mencionada pelo titular da 3ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Belém, juiz Otávio Albuquerque, como um fator que deve ser levado em consideração nos casos de violência de gênero. “Vivemos em uma sociedade de cunho patriarcal, no qual a mulher foi colocada uma posição social subserviente na história. Isso ocorre, entre outros motivos, porque há uma tolerância, inclusive da família, nessas situações de não incentivar a denúncia”, analisa. Rubilene Rosário acrescenta que “o perfil do agressor é o focado na cultura machista. O provedor do lar. Ele se sente dono da vítima. Ela é sua propriedade”, completa a juíza.
Na avaliação do juiz Maurício Ponte de Souza, a medida protetiva cumpre a sua função, já que o índice de descumprimento do recurso é reduzido. “O índice de quebra dentro do mundo inteiro das medidas protetivas é baixo. As medidas protetivas têm, via de regra, uma atividade satisfatória. Então, por exemplo, nós temos cerca de mil medidas protetivas e dentro dos 2% a 5% existem quebras. Às vezes, o agressor não tem conhecimento das medidas protetivas e acaba incorrendo uma situação que se considera quebra, mas não chega a ser uma quebra. E quando há a quebra, nós realizamos uma audiência de justificação para orientar as partes a respeito do efetivo cumprimento. A partir desse momento, depois da audiência, na qual todo mundo fica cientificado, é mais difícil ocorrer novamente, a não ser aqueles casos que são realmente graves”, explica o magistrado.
Mauricio Ponte de Souza acrescenta que a medida protetiva assume uma função pedagógica. “Sem dúvida nenhuma, ela tem essa característica de ensinar que o agressor não pode realizar determinados atos. Às vezes, ele não entende isso em um primeiro momento. Para isso, é feita a audiência de justificação, na qual ele é novamente cientificado, esclarecido da necessidade de cumprimento e, a partir de então, cumpre regularmente as medidas protetivas”, diz.
O juiz Otávio Albuquerque avalia que, apesar do descumprimento da medida não ser frequente, existem meios de tornar a medida eficaz, como multa e a privação de liberdade. “Além disso, temos a Patrulha Maria da Penha e o SOS Mulher que são utilizados em casos em que sejam necessários”, ressalta.
A Patrulha Maria da Penha foi implantada em 2015 em parceria com o Pro Paz Mulher, na Divisão Especializada de Atendimento à Mulher (Deam). A patrulha funciona com revezamento de 20 militares treinados para dar apoio e fiscalizar o cumprimento das medidas protetivas e segurança às mulheres vítimas de violência doméstica. A patrulha faz visitas semanais para conferir de perto se as medidas estão sendo cumpridas. Já o SOS Mulher é um aplicativo de celular. Com três toques no smartphone, a mulher que esteja sob medida protetiva da Justiça e que se sentir ameaçada pelo agressor, poderá acionar a Central de Monitoramento da Guarda Municipal de Belém que se dirige ao local onde ela está por meio do localizador de GPS.
Conscientização
Coordenadora da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do TJPA, desembargadora Diracy Nunes Alves ressalta que a conscientização tem papel fundamental na combate à violência contra a mulher. “Estamos fazendo um trabalho saindo dos prédios, dos tribunais, dos fóruns para ir até o cidadão. Já está sendo executado um trabalho com os operários da construção civil, no qual estamos indo até o canteiro de obras levar informações e orientações aos homens. Nós estamos estendendo essa prática, convênios e cooperações, porque eu acho que somente com a educação nós vamos extirpar da sociedade essa mancha que vem através dos séculos”, explica.
Para viabilizar as palestras nos canteiros de obras, foi viabilizada uma parceria entre o Poder Judiciário do Pará, a Secretaria Extraordinária de Integração de Políticas Sociais do Estado, a Fundação Pro Paz e o Sindicato das Indústrias da Construção do Estado do Pará (Sinduscon). A finalidade é prevenir e combater a violência doméstica contra a mulher em todo o Estado por meio, a exemplo, de orientação e palestras, em especial nos polos de atuação do Propaz.
O juiz Otávio Albuquerque defende que a prevenção é importante no combate à violência de gênero, principalmente pelo fato da conflito estar ligado à questão cultural. “A educação é fundamental e isso não se faz de um hora para a outra. Prevenir é importante para o combate desde a escola. Assim, poderemos erradicar a violência contra a mulher”, afirma.
O magistrado Maurício Ponte de Souza ressalta que a educação é o principal recurso contra a violência de gênero. “Nós temos que educar as pessoas de que a mulher deve ser tratada de forma respeitosa. A educação é a principal característica no meu ponto de vista. Se nós ensinarmos todas as pessoas, as nossas crianças, nossos filhos a respeitar a mulher, esses índices (de violência contra a mulher) diminuirão exponencialmente”, destaca.
Para combater esse tipo de violência, a juíza Rubilene Rosário afirma que é importante a mulher denunciar e buscar o rompimento do ciclo da violência, além de o Estado promover políticas públicas focadas na questão educacional para se quebrar paradigmas, como a cultura do machismo, bem como políticas focadas no empoderamento da mulher e da família como um todo. “O que se observa é uma grande dependência psicológica da vítima em relação ao agressor, o que normalmente dificulta o rompimento do ciclo da violência, ou a dependência econômica, razão também preponderante”, analisa.
A desembargadora Diracy Nunes Alves, coordenadora da Mulher no âmbito do TJPA, reafirma que a principal função do Poder Judiciário no combate a violência contra a mulher é na prestação jurisdicional, principalmente nos casos que pedem urgência.
“É prestar a jurisdição em tempo razoável, principalmente nesse caso que são casos que pedem urgência por conta da segurança das mulheres. Os números que nós temos registrados, que chegam até a polícia, que chegam até as Varas de violência, não significam nem um terço de números de casos diariamente e de várias formas de violência que a mulher vem sofrendo. A gente não pode de nenhuma forma minimizar a gravidade de qualquer denúncia, porque no momento que a mulher vem denunciar já começou a violência lá atrás e não sabemos estágio em que se encontra”, finaliza.
Atualmente, o Judiciário desenvolve a sétima etapa da campanha “Justiça Pela Paz em Casa”, na qual foram propostas, entre as várias ações, mutirões nas Vara especializadas para análise de quase 1,5 mil processos de violência doméstica e familiar contra a mulher.