Desembargador Vice-presidente faleceu nesta quinta-feira, 21
O vice-presidente do Tribunal de Justiça do Pará, desembargador Cláudio Augusto Montalvão das Neves, faleceu na manhã desta quinta-feira, 21 de agosto, em Belém. O velório será no Salão Nobre do Plenário Oswaldo Pojucan Tavares, na sede do TJPA, localizado na avenida Almirante Barroso, 3089, bairro do Souza, e o enterro está marcado para as 10h30 de amanhã, 22 de agosto, no Cemitério Recando da Saudade, após missa de corpo presente, na sede do TJPA, às 9h.
A Presidência do TJPA estabeleceu luto oficial no Judiciário em todo o Estado de três dias, permanecendo as bandeiras a meio mastro. O expediente forense foi suspenso no dia de hoje, assim como a contagem de prazo processual em todo o Estado.
Natural do Estado do Pará, nascido em Belém no dia 12 de maio de 1951, o desembargador iniciou a carreira na magistratura em 1985, após aprovação em concurso público, e chegou ao segundo grau da Justiça paraense em maio de 2006, tomando posse no cargo exatamente no dia em que completou 55 anos. “Quero colaborar, somar e aprender com meus pares, sobretudo, ser útil para a sociedade na aplicação da justiça”, disse o desembargador em seu discurso de posse. Foram 29 anos dedicados à magistratura paraense.
Quarto filho de uma prole de dez, do enfermeiro José Pedro Neves e da dona de casa Diva Montalvão das Neves, Cláudio Montalvão estudou o primário no Grupo Escolar Paulino de Brito, o então ginásio, no turno da noite, com bolsa de estudo, no Instituto Adventista Grão-Pará, e o estudo técnico, equivalente ao então segundo grau, em Contabilidade, no extinto Colégio Ciências e Letras. Em 1973, iniciou a vida acadêmica, ao ser aprovado para o Curso de Direito da Universidade Federal do Pará, concluído quatro anos depois.
Desde criança, sonhava em ser advogado. Quando menino, costumava visitar a Prefeitura Municipal de Belém e assistir aos julgamentos de Tribunal do Júri que, na década de 60, eram realizados no Palácio Antônio Lemos, sede do Executivo Municipal, que também sediava o Judiciário. O sonho virou realidade, em 1978, quando passou a exercer a advocacia, atuando, inicialmente, em todos os ramos do Direito. Escolheu, posteriormente, a área criminal, pela paixão que tinha pelos júris populares.
Em 1985 inicia-se sua história com a Magistratura. Aprovado em concurso público, foi nomeado para a Comarca de Chaves, seguindo depois para Paragominas, Santarém, Capanema e Belém, onde atuou na Vara Distrital de Icoaraci, sendo removido para a 2ª Vara Penal, da qual ficou à frente por 11 anos.
Na Justiça, novamente ficou evidente a sua paixão pela área criminal e pelo Júri Popular. Na 2ª Vara Penal de Belém, que após passou a ser denominada 2ª Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Belém, Montalvão presidiu mais de 600 julgamentos, destacando-se alguns casos de repercussão social como o do assassinato do sindicalista Expedito Ribeiro, em dezembro de 2000; do assassinato do deputado João Batista, em maio de 2001; do caso que ficou conhecido como o “Monstro do Guamá”, em novembro de 2002; do caso Rafael Lobato, condenado pela morte de dois adolescentes, em acidente de trânsito, em maio de 2004; e do caso Dorothy Stang, em dezembro de 2005.
Montalvão também exerceu, por dois mandatos seguidos (1996/1997 e 1998/1999), a presidência da Associação dos Magistrados do Estado do Pará (AMEPA) centrando as atenções no aperfeiçoamento e capacitação do magistrado. Foi vice-presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, de 2002 a 2004, período em que a magistratura nacional voltou as atenções para os debates à cerca da reforma do Judiciário. O magistrado resolveu disputar as eleições para a presidência da entidade de classe pelo engajamento nas lutas em favor das prerrogativas da magistratura, então ameaçadas, sobretudo a referente à vitaliciedade, como forma de manutenção das conquistas já adquiridas pelos juízes.
Atualmente, na condição de vice-presidente, o desembargador Cláudio Montalvão presidia as Câmaras Cíveis e Criminais Reunidas, e era originário da 2ª Câmara Cível Isolada.
Confira, abaixo, o discurso do desembagador Cláudio Montalvão na ocasião de sua posse ao desembargo no dia 12 de maio de 2006:
Agradeço, primeiramente, a Deus, que na sua infinita misericórdia e bondade, concedeu-me o dom da vida e o privilégio de estar vivenciando esta solenidade de minha posse ao cargo de Desembargador do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, neste dia, muito especial, pois nasci no dia 12 de maio de 1951, nesta formosa cidade de Belém do Grão-Pará, sendo o quarto filho da prole de dez, do enfermeiro José Pedro das Neves, conhecido como “Barriga” e Diva Montalvão das Neves, registro in memoriam a eterna saudade de meus pais e a gratidão pela educação que transmitiram a mim e a meus irmãos.
Sinto-me extremamente feliz e orgulhoso da minha ascensão ao Colendo Tribunal de Justiça do Estado, na vaga deixada pela eminente Desembargadora Dra. Climeniè Bernadete Pontes, Magistrada atingida pela compulsória em plena capacidade física e intelectual. Sem dúvida, Juíza de escol, honrou a toga e dignificou a classe a qual pertence por mais de quarenta anos, tendo sido Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Pará e deste Tribunal de Justiça. Assim, vejam a grande responsabilidade que se me impõe ao suceder a tão ilustre julgadora, mas estou cônscio de meus deveres como Desembargador: quero colaborar, somar e aprender com meus pares, sobretudo, ser útil para a sociedade na aplicação da justiça.
Saibam que a chegada nesta Casa de Justiça não foi fácil. Inicia-se a caminhada, desde a infância, com a educação que nos é repassada pelos nossos pais. Portanto, tenho que agradecer o que sou hoje, e devo muito a minha querida mãe Diva Montalvão das Neves, cabocla da região do salgado, precisamente, de Santarém Novo, uma mulher que amava a justiça sem conhecê-la na sua essência, extremamente justa nos corretivos que aplicava em seus filhos. Sabia, com maestria, dosar as penas impostas aos mesmos que poderiam ser: levíssima, leve, grave e gravíssima. Amava a verdade. Era, “sim, sim”, ou “não, não”. Tinha senso de justiça a toda prova. Todos os seus ensinamentos transmitidos, na minha infância, servem, até hoje, como bússola para a vida. O principal deles foi o temor a Deus, “princípio de toda a sabedoria e o respeito ao próximo”. E, assim, criou todos os seus filhos, sendo que alguns concluíram o curso superior, outros não, contudo nenhum apresentou ou apresenta desvio de conduta.
Tenho o dever de falar como foi a minha árdua caminhada. Estudei o primário no Grupo Escolar Paulinho de Brito; o ginásio, no turno da noite, com bolsa de estudo, no Instituto Adventista Grão-Pará, concluindo em 1968. Iniciei o estudo de técnico em Contabilidade no extinto Colégio Ciências e Letras, formando-me em 1971. Já em 1972, iniciei minha preparação para o vestibular ao Curso de Direito oferecido pela Universidade Federal do Pará, no colégio Moderno, estudando no turno da noite, obtendo êxito. Comecei a carreira acadêmica no ano de 1973 e a conclui em 15 de dezembro de 1977, na turma que tem vários colegas, atualmente, na Magistratura, no Ministério Público e advogados de renome militando no mundo jurídico.
Não posso deixar de revelar que esta caminhada teve ajuda de uma mulher guerreira, que conheci no ano de 1973, chamada Rosa de Fátima, conhecida quase por todos neste Tribunal. Casamos em 1977. Nasceu desta união o nosso primogênito, filho querido e amado, Fábio Augusto, em 1978. Em 1980, por sua vez, nasceu Flávio Augusto, filho, também, extremamente amado por seus pais. Quero, nesta oportunidade, agradecer à minha amada Rosa pela compreensão na ausência dos dias em que passei longe dela e de meus filhos queridos, por força do meu dever profissional.
Todos sabem que sonhar não custa nada e, assim, sonhei ser advogado, ainda menino, quando adentrava na Prefeitura Municipal de Belém, para vender bilhetes de loterias e assistia aos julgamentos do Tribunal do Júri que, na década de 60, sucedia-se no Palácio Antônio Lemos e caminhando, incessantemente, em busca de meu sonho, estudando e trabalhando, ele virou realidade, ao começar a exercer a advocacia no ano de 1978, atuando, inicialmente, em todos os ramos do Direito e, passo a passo, dedicando-me como advogado criminal, mais precisamente, perante o Tribunal do Júri, onde realizei dezenas de defesas, naquela época em que não tínhamos os valorosos Defensores Púbicos, posto que os advogados que militavam, no crime, eram nomeados como dativos para defesas dos carentes e necessitados.
Em 1985, submeti-me ao Concurso Público de provas e títulos para o provimento do cargo de Juiz de Direito deste Colendo Tribunal. Aprovado e designado para assumir a Comarca de primeira entrância de Chaves, no Marajó. Em 1986, removido para a Comarca de Paragominas. Posteriormente, em 1988, fui promovido para a Comarca de segunda entrância, sendo lotado na 3ª Vara Cível de Santarém. Em 1993, novamente promovido, pelo critério de merecimento, para Comarca de 3ª entrância – capital –, lotado na 2ª Vara Distrital de Icoaraci. No final de 1995, assumi, por remoção, a 2ª Vara Penal da Capital, na qual permaneci até o dia de hoje. Ademais, como Juiz Eleitoral, atuei em quase todas as comarcas em que trabalhei. Na capital, também, fui designado Juiz Eleitoral da 30ª e 76ª Zonas Eleitorais e, em 1998, designado Juiz Auxiliar e nas demais eleições de 2000 e 2002. A partir de 2003, passei a ser membro do Colegiado do TRE/PA e, em 2005, fui reconduzido, trabalhando até a sessão do dia de ontem perante àquela Egrégia Corte de Justiça.
Não poderia deixar de frisar que a caminhada foi penosa até chegar ao dia de hoje, em busca do sonho de alcançar o patamar da carreira. Como se vê, atuei como Juiz de primeira instância por mais de vinte anos, trabalhando, incansavelmente, em todas as Comarcas por onde passei e, afinal, o reconhecimento deu-se com dezessete votos dos Desembargadores numa composição de vinte e cinco, por ocasião da votação de minha promoção. Repito, estou, excessivamente, lisonjeado e honrado ao chegar a esta Casa, respeitando a decisão da votação dos Senhores Desembargadores, sem violentá-los e sem perder a ética, que é dever inerente à pessoa do Magistrado. E aproveito a ocasião para agradecer, publicamente, os votos obtidos. Já em relação aos votos desfavoráveis à minha promoção, farei o possível de conquistá-los, nesta Corte, que chego sem mágoas, de quem quer que seja, pois, no meu coração, não há espaço para esses sentimentos, somente para aqueles nobres, como o amor. O trabalho sempre foi, é e será o meu norte. Como se nota, o presente recebido pela minha promoção a este Tribunal foi conquistado após 20 (vinte) anos de labuta como Juiz de 1ª instância. Impõe-se informar que, durante todo este período, nunca usufrui licença especial tampouco licença-saúde, graças a Deus, e tenho, ainda, 7 (sete) meses de férias não gozadas em face da necessidade de permanecer no trabalho.
Neste momento, peço vênia para transcrever certos trechos do discurso que proferi em nome dos Juízes empossados, quando do ingresso na Magistratura deste Estado, na data de 18 de outubro de 1985, o qual serve, ainda, para os dias de hoje, publicado na Revista do Tribunal de Justiça - ano 1985, volume 37, páginas 208 e 209 :
Segundo o emérito Rui Barbosa, assim se expressou:
“A ninguém importa mais do que à Magistratura fugir do medo, esquivar humilhações e não conhecer covardia. Todo o magistrado tem muito de heróico em si mesmo, na pureza imaculada e na plácida rigidez; que a nada se dobre, e de nada se tema, senão de outra justiça, assente, cá embaixo, na consciência das nações, e culminando, lá em cima, no juízo divino”.
E conclui:
“Lembrando-nos que um dia seremos julgados em última instância por Deus, a quem vamos prestar contas pelos atos realizados no Judiciário, e queira Deus que todos nós possamos ser absolvidos”.
Destaco que alguns desses colegas empossados já estão ocupando assento neste Colegiado: os Doutos Desembargadores Constantino Augusto Guerreiro e Ricardo Ferreira Nunes.
Nesta carreira jurídica, o destino privilegiou-me ao suceder duas renomadas Magistradas: as Doutoras Yvonne Santiago Marinho e Climeniè Bernadette de Araújo Pontes, ao ser designado Juiz da 2ª Vara Penal da Capital e ao ora Desembargo, respectivamente. Espero que tenha me desincumbido do meu mister, no primeiro grau de jurisdição, satisfatoriamente, à frente daquela Vara Penal, que foi tão bem conduzida pela minha antecessora, hoje, Desembargadora decana deste sodalício. É bom salientar que estou plenamente consciente de que, suceder a eminente Desembargadora Climeniè Pontes, é tarefa por demais difícil, já que foi Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Pará e deste Augusto Tribunal, atuando por mais de quatro décadas na distribuição da justiça e, ainda, é oportuno revelar que guardo, na minha memória, a lembrança da Douta Juíza, quando estava à frente da 8ª Vara Cível, desta Comarca, no ano de 1979. Assim, verifica-se que a minha missão de sucessor será quase impossível de superá-la, mas, espero, com a ajuda de Deus, vencer todos os óbices que forem surgindo, no dia-a-dia, para não decepcionar a ilustre Desembargadora e, especialmente, os meus pares e os jurisdicionados.
Não seria justo encerrar este discurso sem falar um pouco do PODER JUDICIÁRIO e a maior crítica feita a ele é em face da sua morosidade na prestação da tutela jurisdicional, a qual não se pode negar a veracidade, mas, não podemos imputar a responsabilidade somente ao Judiciário. O Poder Legislativo, também, tem parcela de responsabilidade pela lentidão na conclusão das reformas das leis que tramitam, por muitos e muitos anos, no Congresso Nacional, não acompanhando, desta maneira, as constantes transformações sociais, deixando, em muitos casos, a sociedade com sentimento de insegurança jurídica, violando-se os fins do Direito: paz social, justiça e segurança jurídica. Devo informar aos presentes que, quando estudava disciplina Direito Penal, no antigo casarão do Largo da Trindade, o meu saudoso professor, Desembargador Edgar Vianna, ministrava as aulas pelo Código Penal de 1940 em vigor até os dias de hoje e pelo Projeto do Código Penal de 1969, que estava tramitando, naquela época, no Congresso Nacional. O professor tinha a certeza de que o Código de 1969 entraria logo em vigor e que seus alunos iriam executar suas atividades profissionais com base no referido Código. Ledo engano. Só em 1984, tivemos a reforma da Parte Geral do Código Penal.
E, somente em 28 de março de 2005, por meio da Lei nº 11.106, alteraram-se alguns artigos e outros foram revogados do Diploma Penal Pátrio.
Entretanto, a minha preocupação maior, como Juiz e cidadão, é com relação ao Código de Processo Penal. Após uma década vivenciando os procedimentos referentes ao Tribunal do Júri, conclui que a fase judicial, ou seja, o “sumário de culpa”, que vai da Denúncia à Pronúncia, deve ser eliminado do nosso ordenamento jurídico. Devemos não só lutar por uma linguagem jurídica simples como também pela simplificação dos procedimentos.
Com a eliminação da fase judicial, o acusado será julgado em tempo exíguo, na presença de seu Juiz Natural, que decidirá pela absolvição ou condenação. São aqueles Juízes de fato que têm a competência de julgar os crimes dolosos contra a vida, obedecendo-se o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, assegurados em nossa Constituição Federal. Por que perder tempo com toda uma fase perante o Juiz de Direito, se este não tem a competência de julgar? Abolindo-se a fase judicial, a prestação jurisdicional será mais eficiente e célere. O julgamento de um crime de homicídio poderá ocorrer num prazo máximo de 4 (quatro) meses contados da data do fato até o seu julgamento.
Com o julgamento mais rápido, o acusado passará o menor tempo no cárcere, como preso provisório. Se for condenado, terá tratamento com base na Lei de Execuções Penais e a progressão do regime de pena em seu favor. Se absolvido, conseguirá o almejado Alvará de Soltura.
Não é só importante o acesso à Justiça, mas a satisfação do jurisdicionado em ver concluído o seu processo, criminal ou cível, no mais breve espaço de tempo possível. E com a Sentença transitada em julgado, o Poder Judiciário cumpre, efetivamente, o seu verdadeiro papel constitucional, consoante se depreende do seu art. 5º, LXXVIII.
Por fim, agradeço, penhoradamente, nesta noite memorável para minha pessoa, a presença de todos, dos meus irmãos e demais familiares, dos amigos, dos colegas, dos funcionários deste Tribunal e do Tribunal Regional Eleitoral, da minha esposa Rosa, dos meus filhos Fábio e Flávio, do meu querido e amado netinho Fabinho, da minha nora e da futura, e, principalmente, daqueles funcionários que trabalharam com este Magistrado nas comarcas do Estado e os da 2ª Vara Penal da Capital e, ainda, agradeço as palavras bondosas e de reconhecimento da caminhada árdua na trajetória deste julgador, que foram proferidas pela Douta Desa. Marneide Trindade Pereira Merabet que fez uso da palavra em nome deste sodalício, como também do eminente Procurador-Geral de Justiça, Dr. Francisco Barbosa de Oliveira, que falou em nome do Ministério Público e, também, do ilustre Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Pará, Dr. Ophir Filgueiras Cavalcante Junior, manifestando-se em nome da classe que representa.
Deixo como meditação:
“DEUS NÃO ESCOLHEU OS PREPARADOS. ELE PREPARA OS ESCOLHIDOS”.
Boa noite e muito obrigado.