Projeto ensina a agir em casos de crianças e adolescentes
Vários episódios de abuso sexual, violência psicológica e física contra crianças e adolescentes, foram relatados durante a visita do projeto “Minha Escola, Meu Refúgio”, à Escola Municipal de Ensino Fundamental Augusto Meira Filho, no Bengui, na manhã desta quarta-feira, 17, uma evidência da gravidade da situação já constatada pela Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes, onde metade dos processos em tramitação refere-se a casos de violência sexual, segundo a juíza titular da Vara, Mônica Maciel, que coordena o projeto.
O objetivo da iniciativa, segundo ela, é reforçar a rede de proteção social, com o apoio da comunidade escolar e de agentes comunitários de saúde, para identificar situações, prevenir ocorrências, assegurar atendimento especializado às vítimas e punir os abusadores.
“A maioria das violências físicas, psicológicas e abusos sexuais acontece no ambiente familiar e a família muitas vezes se fecha para pedir ajuda, por saber das consequências legais. A escola surge como uma porta de entrada da rede de proteção, é uma espécie de segundo lar, onde a criança estabelece relações de confiança e afetividade. O educador pode ajudar ao reconhecer os sinais, as mudanças de comportamento que indicam a violência e buscar ajuda especializada e a notificação dos casos”, informa a juíza, para explicar o que motivou o projeto “Minha Escola, Meu Refúgio”.
Iniciado este ano, nos meses de maio e junho, após reuniões com 43 diretores de escolas da rede pública municipal, o projeto já visitou 11 escolas, oito na região das ilhas de Belém e três na capital.
A dinâmica é simples: auxiliada pela equipe técnica multidisciplinar da Vara e acompanhada pelo promotor da Infância e da Juventude, a juíza projeta slides com informações sobre a legislação e o modo de ação dos abusadores e apresenta alguns casos, a título de exemplo, para abrir o debate com a comunidade.
Nesta quarta, estavam presentes pais e mães de crianças matriculadas na escola.
Marineti dos Santos, ex-agente comunitária de Saúde, mãe de um casal de filhos, relatou o caso da filha de uma amiga, abusada aos 10 anos por um parente com o qual a mãe permitia que ela viajasse constantemente do interior à capital.
O fato foi descoberto somente quando a menina contraiu uma Doença Sexualmente Transmissível (DST). “Eu perguntei, ‘por que tu nunca conversou com ela (sobre o abuso)?’ E ela me disse, chorando: ‘eu nunca conversei com ela porque eu também sofri abuso; meu patrão abusou de mim na idade dela’”.
Regiane Lopes também tem um casal de filhos e elogiou o caráter esclarecedor da palestra, sobretudo com relação aos cuidados que pais e responsáveis devem adotar não apenas em relação aos próprios filhos, mas também com as demais crianças e adolescentes da comunidade.
“Ela falou uma coisa muito importante: que a gente pode denunciar sem se identificar”, disse, ao lembrar o Disque 100 da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, que recebe denúncias de casos de violência sexual em todo o País, com ligação gratuita.
Adriana Lopes tem um filho de 11 anos e diz que sempre estabeleceu uma relação de confiança com ele, alertando-o para os riscos de abuso sexual, das drogas e outras violências.
Ela relatou o caso de um amigo que foi abusado pelo próprio tio desde os nove anos e que o ameaçava e costumava culpá-lo por ser vítima do abuso. “Ele ameaçava e dizia que ele tinha um jeito meio fresquinho, de viadinho, e meu amigo acha até hoje que foi o culpado e não o tio dele. Ele até hoje mora só, se relaciona com homens, mas vive isolado, fechado”, disse ela.
A juíza Mônica Maciel disse a pais e professores da escola Augusto Meira Filho que, no caso de uma criança revelar o abuso sexual, é preciso ouvi-la pacientemente, sem pressioná-la ou adotar reações que possam agravar-lhe a angústia, esclarecendo que ela não tem culpa e agiu certo ao confidenciar a violência, sem repreendê-la se o abuso ocorreu porque ela contrariou regras básicas. “Esse conteúdo que nós trazemos nas visitas mostra quais os sinais indicativos de violência e como a escola pode agir a partir do momento que toma conhecimento da suspeita ou do fato”, informou a juíza.