Desembargador Ricardo Nunes fala sobre o Plano de Gestão da Justiça
O jornal O Liberal publicou no domingo passado, 23, entrevista com o desembargador Ricardo Ferreira Nunes, presidente do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), sobre o seu plano de gestão para o biênio 2017-2019, que reproduzimos no Portal do TJPA na íntegra, uma vez que, por problemas de espaço, algumas questões tratadas na entrevista não foram publicadas naquela edição do jornal, que, gentilmente, nos cedeu o texto para a publicação.
"Garantir direitos da cidadania, acelerar a resolução das demandas judiciais e aumentar a produtividade no atendimento jurisdicional. Impulsionar as ações de combate à corrupção e à improbidade administrativa. Fortalecer alternativas para a solução de conflitos por vias extrajudiciais. Aprimorar a gestão da Justiça criminal para o enfrentamento da violência contra mulheres, idosos, crianças e adolescentes, LGBTs e outros grupos vulneráveis. Promover ações de ressocialização de apenados, aperfeiçoar a aplicação dos institutos penais para aliviar a tensão no sistema prisional. Modernizar a infraestrutura do Judiciário, inclusive com a implantação do projeto piloto de uma unidade judiciária ou administrativa sustentável e criar o Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário (NAT-JUS) para subsidiar os magistrados em demandas judiciais relacionadas à saúde. Esses são alguns dos principais temas que embasam o Plano de Gestão com o qual o novo presidente do Tribunal de Justiça do Pará, desembargador Ricardo Ferreira Nunes, conduzirá o biênio 2017-2019. Com pouco mais de 60 dias à frente do Judiciário paraense, ele diz nesta entrevista de que forma pretende enfrentar os desafios do Judiciário, em uma conjuntura de orçamentos públicos severamente afetados pela crise econômica no País.
Um plano de gestão de dois anos é suficiente para o enfrentamento de todos esses temas?
As ações do Judiciário no País são balizadas pelo Planejamento Estratégico Nacional elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em conjunto com todos os segmentos judiciários. Em dezembro de 2014, o Judiciário paraense, baseado nas definições nacionais, instituiu o seu planejamento estratégico para o período 2015-2020, que foi revisado e atualizado em dezembro passado. Além de definir missão, visão e valores da instituição, o planejamento estabelece os macrodesafios, principais entraves a serem enfrentados para melhorar o desempenho do Judiciário, com vistas a solucionar os conflitos sociais. Paralelamente, a Justiça Nacional trabalha com metas, que são o padrão ideal de desempenho a ser alcançado e mantido, de tal forma que as ações estratégicas iniciadas em uma gestão sejam aprofundadas e aprimoradas pela que vem a seguir, sem que haja solução de continuidade, porque o planejamento estratégico, que se desdobra em planos de gestão bienais, baliza também o Plano Plurianual e os orçamentos anuais do Judiciário.
O seu plano de gestão estabelece ações voltadas à garantia dos direitos da cidadania. O que o cidadão pode esperar no que se refere a ações?
Abrimos o mês de abril, o terceiro de nossa gestão, iniciando em Marituba uma nova ação de itinerância, que leva o atendimento dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos (Cejusc) ao interior, garantindo às pessoas a oportunidade de resolver aquele problema que as afligem e que muitas vezes depende de uma ida a um grande centro urbano, o que requer tempo e gastos. O "Cejusc Itinerante" permite, por exemplo, que se agende divórcios consensuais, exames de DNA para reconhecimento de paternidade, a orientação jurídica, além de conciliações em processos de guarda compartilhada, divórcio, ações de alimentos e relação de consumo, entre outras. É um projeto em parceria com as prefeituras, que disponibiliza também serviços médicos e odontológicos, expedição de documentos, vacinação, enfim, um mutirão de serviços públicos para assegurar ao cidadão direitos que muitas vezes ele não desfruta por absoluta falta de acesso. Já estão programadas ações do "Cejusc Itinerante" em Benevides, no dia 6 de maio; Castanhal, 10 de junho; e em Icoaraci, em 1º de julho.
Nessa mesma linha, vamos expandir projetos como o Ribeirinho Cidadão, que atua junto a comunidades que vivem em áreas remotas e de difícil acesso às margens dos rios, bem como os já consolidados Esporte com Justiça, que cuida da pacificação social em grandes eventos desportivos; e o Verão com Justiça, que marca a presença reguladora do Judiciário nos balneários mais frequentados pelo público durante as férias de julho.
Vamos ampliar também projetos relacionados à infância e à juventude, em várias frentes: violência sexual, reconhecimento de paternidade e reencontro físico e emocional das famílias, preservação do histórico da adoção, reinserção social dos socioeducandos, capacitação de agentes voluntários e círculos de diálogo sobre violência doméstica.
No campo das ações coletivas, que visam a garantia dos direitos difusos e coletivos e que defendem a tutela de toda a comunidade, planejamos manter ao menos quatro semanas específicas para impulsionar a tramitação desses processos, mantendo grupos regionais de juízes e analistas mobilizados para julgá-los. As ações coletivas integram uma das metas nacionais.
Uma das queixas em relação ao Judiciário é a morosidade. Como o seu plano de gestão pretende enfrentar esse problema?
Vamos fortalecer o grupo que faz a gestão do cumprimento das metas de redução do congestionamento processual e do aumento de atendimento à demanda, medida essencial para melhorar a eficiência da prestação jurisdicional. Teremos um canal de comunicação rápida que permita a esse grupo gestor, à presidência do TJPA e aos próprios magistrados, acesso a informações relevantes sobre produtividade de juízes e servidores e sobre congestionamento e atendimento à demanda, o que incentivará os magistrados a alcançar as metas de produtividade e subsidiará a presidência do TJPA a adotar medidas concretas, inclusive quanto à ampliação da estrutura judiciária.
Esse canal de comunicação criará as bases para o desenvolvimento do "Justiça 1.000", uma outra novidade deste plano de gestão, cujo objetivo é aumentar a produtividade dos magistrados do TJPA para, no mínimo, mil processos julgados por ano. O projeto prevê ainda, que em situações de dificuldade para o atingimento da meta de 1.000 processos ano, os magistrados poderão contar com a participação de juízes auxiliares colaboradores em uma ação concentrada, por meio virtual.
A implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJe) nas Varas Cíveis é outra medida fundamental para melhorar a eficiência processual, pois agiliza a tramitação, reduz gastos com impressos, padroniza rotinas e simplifica os procedimentos relacionados aos fluxos do processo.
Um outro passo importante para o aperfeiçoamento da estrutura judiciária é a decisão de especializar uma das Varas da Fazenda na capital em matéria de saúde pública, destinando a ela as demandas de caráter individual nessa área, sem prejuízo de suas competências originais e respeitadas as atribuições da Vara do Juizado Especial de Fazenda Pública. Vamos implantar também um Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NAT-JUS) para ações relacionadas à saúde pública, constituído por profissionais de saúde para elaborar pareceres médicos e subsidiar magistrados nas demandas judiciais.
Operações como a Lava-Jato trouxeram a corrupção e a improbidade para o centro do debate público. Como essa questão é enfrentada pelo Judiciário no Pará?
Entre as metas nacionais, há uma que determina que a justiça em todas as suas instâncias dê prioridade ao julgamento dos processos relativos à corrupção e à improbidade administrativa, em especial corrupção ativa e passiva, peculato em geral e concussão. No Pará, nós vamos fortalecer os grupos regionais de juízes e analistas mobilizados para julgar essas ações, reservando ao menos quatro semanas no ano voltadas a impulsionar essa tramitação.
A judicialização dos conflitos é uma realidade nacional e, mesmo que o Judiciário se esforce para reduzir o estoque de processos, é grande a quantidade de novas ações apresentadas. Como se resolve esse impasse?
O Judiciário tem investido muito, em todo o País, na adoção de soluções alternativas aos conflitos, criando e fortalecendo políticas e ações de resolução negociadas, via mediação e conciliação. O novo Código de Processo Civil tornou a conciliação um imperativo categórico para a aplicação da lei. Nós vamos fortalecer políticas alternativas, ampliando a ação dos Centros judiciários de solução de conflitos (Cejuscs) e o Cejusc Itinerante, que se iniciou em Marituba, bem como expandindo a estrutura física e de pessoal do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Resolução de Conflitos, o Nupemec, ampliando parcerias para a formação de mediadores e conciliadores e introduzindo ferramenta tecnológica para a mediação digital.
Nessa linha, desponta a experiência bem sucedida das jornadas de conciliação organizadas pelas Varas de Execução Fiscal de Belém, replicada na área Cível, neste caso, em cooperação com o Nupemec. O objetivo é reduzir o acervo processual e o congestionamento nas unidades judiciárias, por meio da negociação entre as partes, dando solução definitiva aos processos em fase de execução e cumprimento de sentença.
O País vive uma escalada de violência que atinge principalmente os mais vulneráveis, idosos, mulheres, crianças, jovens, LGBT, entre outros. Como o Judiciário do Pará enfrentará essa questão?
Concentraremos esforços no combate à violência contra as mulheres, o idoso, a criança o adolescente e todos os outros grupos vulneráveis, por meio de campanhas públicas, a exemplo de ações como a da "Justiça pela Paz em Casa", de conscientização sobre a violência doméstica e familiar, promovendo eventos e palestras de prevenção em escolas, entre trabalhadores da construção civil e do comércio, ao lado do esforço concentrado para julgar processos e combater à impunidade em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Estamos em diálogo com as prefeituras municipais da Região Metropolitana de Belém para estender o uso do aplicativo S.O.S Mulher e da Patrulha Maria da Penha, já utilizados em Belém, como medidas protetivas.
Vamos fortalecer as práticas de justiça restaurativa que oportuniza a reparação dos danos do delito às partes envolvidas, sem prejuízo da punição, e quando possível, reconstrói as relações rompidas. Também vamos expandir a aplicação de penas e medidas alternativas, ampliando a rede social da garantia da devida aplicação e acompanhamento da pena, sem afastar o beneficiário do convívio social, reduzindo o encarceramento e as taxas de reincidência.
Quanto à situação no sistema carcerário, no próximo dia 28 de abril concluiremos o esforço concentrado, durante o qual todas as varas com competência criminal no Estado revisaram mais de três mil processos de réus presos há mais de 180 dias, conforme determinação da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia.
Um dos empecilhos à prestação de serviço jurisdicional de qualidade é a falta ou a precária situação dos fóruns das comarcas, sobretudo no interior do Pará. Quais são as medidas previstas para melhorar a situação?
Uma das primeiras providências tomadas foi determinar à Secretaria de Engenharia e Arquitetura que fizesse um levantamento para diagnosticar a situação dos prédios das comarcas no interior, com o objetivo de direcionar investimentos a curto, médio e longo prazos, seja para reformas, seja para as melhorias urgentes de infraestrutura, mesmo tendo em vista o forte ajuste fiscal que está sujeito o setor público brasileiro. Além disso, vamos iniciar uma experiência inédita: um projeto piloto de unidade sustentável, com estratégias para a redução do consumo de energia elétrica, melhor uso da água, maior eficácia na limpeza, aproveitamento da iluminação natural e toda uma série de requisitos afinados com o meio ambiente. O objetivo é validar o investimento e posteriormente replicar as melhores práticas. Essa medida será combinada com a institucionalização do programa "Reciclar Direito", do Núcleo de Desenvolvimento Sustentável do TJPA, por meio do qual o Judiciário tem estimulado a mudança dos padrões de compra e consumo para otimizar os recursos naturais, garantindo gestão adequada dos resíduos gerados e a melhoria contínua dos processos de trabalho, adotando critérios de sustentabilidade nas contratações e assegurando qualidade de vida no ambiente de trabalho a servidores e magistrados. Essas iniciativas têm também um forte caráter social de inclusão, pois as 29 toneladas de material recicláveis que coletamos no ano passado constituíram fonte de renda a sete cooperativas de catadores e já estamos, inclusive, inserindo egressos do sistema carcerário nessas atividades.