"O Sistema Único de Saúde (SUS) não é para rico e nem para pobre, é para todos. Este é o primeiro mito que temos que derrubar no país, que SUS é coisa de pobre, SUS não é coisa de pobre, SUS é coisa de brasileiro, criado para funcionar. A porta de entrada do SUS não é por um critério econômico, se o Sistema é o da Seguridade Social, o acesso é universal”, disse o juiz do Judiciário do Pará, Homero Lamarão Neto, nesta quarta-feira, 24, no segundo dia do Encontro Jurídico: 30 anos da Constituição da República, promovido pela Escola Superior da Magistratura do Pará (ESMPA). O tema abordado pelo magistrado, que é doutor em Direito pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e coordenador do Comitê Interinstitucional de Resolução Administrativa de Demandas de Saúde (Cirads), foi "A Judicialização da Saúde e os 30 anos da Constituição".
O palestrante abordou a saúde pública, a evolução trazida com a Constituição de 1988 e os modelos de sistema de saúde. "A CF/88 trouxe avanços e o Sistema Único de Saúde fez uma abrangência em relação ao atendimento no campo da saúde. Nós precisamos ainda discutir alguma coisa no sentido de aumentar o campo de atuação e concretizar direitos que hoje já são previstos, mas negar o avanço de 1988 pra cá, não é possível fazer. A saúde é tratada na CF/88 como um direito de todos e um dever do Estado, a grande questão que verificamos é que em vários Estados da Federação não conseguimos observar a concretização de direitos elementares ou básicos à sociedade, como consultas, vacinação, cirurgias. E ainda temos que lidar com a deficiência de leitos no Brasil”.
A Medicina baseada em evidências, também foi explicada pelo magistrado. “O Judiciário é regido pelo Princípio de Inércia da Jurisdição, ou seja, ele age quando provocado. O julgamento das ações de saúde hoje é todo organizado e monitorado pelo Conselho Nacional de Justiça através do Fórum da Saúde. Então, hoje em dia por exemplo, todos os tribunais têm se organizado de uma maneira geral para que o julgamento dessas ações em que se pede por exemplo, medicamentos, seja analisado sob o prisma da Medicina baseada em evidências, de forma que prestigia-se aquilo que o SUS já oferece, para se partir para além das políticas públicas do SUS somente quando há uma comprovação nos autos de que aquele medicamento específico do SUS não produz aquele efeito ao paciente ou algo do gênero”.
O juiz Homero Lamarão Neto falou ainda sobre o déficit de leitos, o congelamento do orçamento da saúde e chegou à constatação de que será necessária uma mudança para que o SUS cumpra sua finalidade. "O cenário é desalentador e a única forma que temos em fazer uma modificação no cenário que hoje está posto em relação à saude pública é implementarmos uma revisão do congelamento de gastos em saúde pública. Se não for assim, infelizmente, é muito difícil pensarmos num país melhor para daqui a 20 anos. Sem idealismos e sem bandeiras, é uma situação matemática, a conta não está batendo. Temos que decidir se a saúde é ou não um direito fundamental, e, em sendo, o congelamento é inaplicável sob o meu ponto de vista”.
Dentre os participantes que lotaram o auditório e a sala que transmitiu simultaneamente o evento na ESMPA, os estudantes Ágatha Soares Amaro, Tiago Fernandes e Mateus Carvalho, alunos do segundo semestre do Centro Universitário do Estado do Pará (Cesupa), elogiaram o tema discutido nesta quarta-feira. "É importante discutirmos a saúde, ter mais conhecimento sobre isso. Ver o que mudou desde a Constituição e o que ainda precisa ser mudado. Enfim, o que está na legislação mas não é cumprido pelo Poder Público”, resumiu Ágatha.
Thayná Cavalcante, bacharela em Direito e que estagiou no TJPA, considerou a palestra muito esclarecedora e metodologicamente adequada ao público. “Deixou uma reflexão bem pertinente para nosso quadro social e econômico atual. Já se passaram trinta anos de promulgação da Constituição e o país não alcançou nem metade daquilo que foi projetado em 1988. Encontros como esse são muito proveitosos e deveriam ser recorrentes”.
O desembargador Constantino Augusto Guerreiro agradeceu a presença do juiz Homero Lamarão e disse ficar feliz em ter acompanhado a trajetória do magistrado. O diretor-geral da ESM disse ainda que a palestra foi engrandecedora do conhecimento de todos e compartilhou da dificuldade em julgar o tema, considerando a urgência que os casos requerem, os pedidos serem geralmente realizados durante os plantões e estarem diretamente ligados à vida de alguém.
Além de acadêmicos e profissionais do Direito, participaram do segundo dia do Encontro Jurídico: 30 anos da Constituição da República, Aníbal Pinheiro, secretário-geral, Patrícia Blagitz, diretora de ensino e pesquisa, e Paulo Victor Correa, diretor acadêmico, todos da Escola Superior da Magistratura do Pará.