Vara de Crimes Ambientais ajuda a manter projetos de alcance social
Poucos percebem, mas o trabalho da Vara do Juizado Especial de Crimes Ambientais tem sido essencial para a manutenção, prevenção, educação, proteção e conservação do meio ambiente. Nos últimos sete anos, as atividades do Juizado ajudaram projetos de instituições como o Museu Paraense Emílio Goeldi, o Batalhão de Polícia Ambiental e a Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA).
Em parceria com instituições públicas e da sociedade civil, o juizado mantém programas de educação ambiental obrigatórios para quem comete delitos nessa área e destina recursos provenientes de transações penais para a compra de alimentação, medicamentos, manutenção de projetos como Carroceiro e Vida Digna, mantidos pela UFRA para atendimento veterinário a animais que transportam cargas em Belém e passageiros em Cotijuba, e para controle populacional de cães e gatos.
O médico veterinário Heriberto Figueiredo, coordenador do Projeto Carroceiro, informa que os cavalos de tração são responsáveis hoje por 90% da renda de cerca de mil famílias que vivem nas áreas de periferia de Belém. Só na Região Metropolitana de Belém há, segundo ele, em torno de três mil a quatro mil cavalos, atuando como animais de tração para o transporte de cargas, a maioria deles como única fonte de sobrevivência das famílias proprietárias. Já o projeto Vida Digna busca o controle populacional de cães e gatos abandonados para evitar a proliferação de doenças como a raiva humana, que não tem cura e mata. O atendimento é gratuito e somente no ano passado foram feitas 600 castrações de cães e gatos. A parceria com o Juizado de Crimes Ambientais assegura a aquisição de medicamentos, ração e outros materiais necessários ao prosseguimento dos projetos, como ressalta o veterinário Heriberto Figueiredo.
“A parceria com o juizado é uma das bases de sustentação para que o Projeto Carroceiro funcione, porque através das multas a gente consegue fazer toda a manutenção, principalmente em se falando de aquisição de medicamentos e materiais de procedimentos, até porque todo o nosso trabalho é voltado para pessoas de baixa renda que não têm condições de pagar um veterinário. Então, essa parceria faz com que a gente continue até hoje, desde 2009, atendendo gratuitamente todos os animais que são mutilados, maltratados, apreendidos pela Dema, pelo Centro de Controle de Zoonoses, Batalhão de Polícia Ambiental. A universidade entra com a estrutura física, que foi construída com dinheiro do Ministério da Justiça, com técnicos, alunos, os nossos salários, energia elétrica, mas para o projeto funcionar não temos uma verba específica. Então, a colaboração do juizado é essencial, não só para o Projeto Carroceiro, como para o projeto Vida Digna”.
BPA
No Batalhão de Polícia Ambiental (BPA), o comandante Mauro Figueiredo considera a parceria essencial para que o seu comando cumpra a sua finalidade de fiscalizar e atuar na prevenção e educação ambiental. O BPA mantém programas de educação ambiental vinculados ao juizado e também recebe ajuda material das transações penais. “Nós temos um auditório com boas instalações por causa disso; às vezes vêm poucos recursos, todo mundo reclama, aí vem essa ajuda fundamental para o nosso dia a dia, a manutenção do nosso trabalho não só dentro do batalhão, mas também nas nossas atividades externas, as nossas fiscalizações. Agora, há pouco tempo, fizemos a aferição dos nossos equipamentos de fiscalização de poluição sonora, os decibelímetros, e quem pagou a aferição em São Paulo foi uma pena através do Juizado de Crimes Ambientais.
O Museu Emílio Goeldi também participa da parceria, recebendo ajuda material das transações penais e mantendo programa de educação ambiental que recebe pessoas que prestam serviço compulsório como medida alternativa por delitos na área. A coordenadora do Serviço de Educação do Goeldi, Hilma Cristina Guedes, diz que a iniciativa da instituição tem como base a informação como instrumento de construção da cidadania. “A nossa função é transformar esse problema que ele causou no ambiente; ele vem pra cá com o objetivo de entender porque é importante preservar, ser informado sobre essas leis ambientais, pra que que elas servem, porque elas precisam ser cumpridas, porque a gente precisa denunciar a agressão ao meio ambiente. Através do diálogo, a gente consegue repassar as informações para que qualquer cidadão possa atuar no ambiente em que vive, porque, por falta de informação, você não sabe como agir quando presencia uma agressão ao meio ambiente”, diz ela.
POLUIÇÃO
À frente do juizado desde que ele foi criado em 2007, a juíza Maria Vitória Torres do Carmo enumera ações que considera relevantes de sua atuação, como o combate à poluição sonora na área da Doca de Souza Franco, onde os bares foram obrigados a instalar o isolamento acústico, e à poluição atmosférica provocada pela fumaça negra dos ônibus. “No caso da poluição atmosférica, estabeleci como medida de recomposição do dano a obrigatoriedade das empresas fazerem a manutenção permanente dos veículos”, disse ela. Quanto à poluição sonora, ela diz que hoje a Doca e todo o Umarizal apresentam uma situação bem diferente de quando ela assumiu o juizado. “Hoje, ainda persistem situações preocupantes em bairros como a Pedreira e o Jurunas, mas avançamos bastante nessa questão em Icoaraci e Outeiro, onde todos os bares tiverem que firmar Termos de Ajuste de Conduta com o Juizado e o Ministério Público”, diz ela.
Quanto às transações penais, ela explica que não há repasse de dinheiro. “A pessoa pode fazer prestação de serviços ou pecuniária. Eu encaminho com um ofício à instituição, que dá a ela uma lista de material dentro do valor estipulado na medida. Quando é empresa, encaminho para instituições que precisam de ajudas mais substanciais”, diz ela. A transação penal é uma medida substitutiva à pena de privação de liberdade. Cumprida a transação e feito o programa de educação ambiental, a juíza manda dar baixa no procedimento administrativo que não se configura em processo criminal e não gera, portanto, antecedentes.
Uma medida que ela julga necessária – objeto de projeto apresentado por ela, quando assumiu a vara em 2007 – é a ampliação da competência do juizado para julgar também delitos de maior potencial ofensivo, que hoje são de competência das varas comuns. “A lei dos crimes ambientais é uma lei especial, que exige portanto tratamento e sensibilidade diferenciadas”, argumenta.